A Síndrome do Impostor na Maternidade: A Pressão Invisível que Assombra as Mães

A maternidade tende a ser uma das experiências mais significativas na vida de uma mulher. Entretanto, em virtude da forma como nós, mulheres, fomos educadas/moldadas perante a sociedade, algumas mulheres-mães podem desenvolver a Síndrome do Impostor. Embora este termo seja vivenciado por muitas pessoas, como psicóloga, ouso a dizer que na maternidade esta Síndrome é mais dolorosa.. Por que eu afirmo isso?

Você, como mãe, ou como ser humano que veio de uma mulher, ou que convive com mulheres que são mães, deve ter percebido o estado de vulnerabilidade que a mulher passa a vivenciar quando começa a experienciar a maternidade. O estado de vulnerabilidade potencializado com a Síndrome de Impostor não é uma combinação que eu considere saudável para um momento de extrema sensibilidade.

A Síndrome de Impostor gera dúvidas e angústias. A mulher passa a questionar sua conduta frente à maternidade: “será que eu sou boa?”, “será que estou fazendo do jeito certo?”, “fulana parece ter uma vida tão bem mais resolvida”, “por que ela consegue e eu não?”, “por que eu sinto que nada do que eu faço é o suficiente?”, “eu faço tudo para minha criança mas ela parece querer sempre mais”, entre outras. Quando questões como estas são frequentemente trazidas mães, pode ser que esta pessoa esteja passando por um momento consideravelmente conflituoso. Afinal, “eu preciso cuidar do meu neném, mas como faço isso se eu não me sinto segura?”

Este artigo tem por intuito discorrer sobre o que pode vir a ser a Síndrome do Impostor na maternidade. Irei pontuar algumas experiências minhas como profissional que atende mães, e como lidar com este “momento”. Vamos lá?

O que é a Síndrome do Impostor?

  1. Sentimentos de inadequação: afinal, qual é o papel da mãe? Onde que encontramos este manual? Precisamos trazer para este cenário algo que pouco se vê nos textos sobre a maternidade: o papel e a influência da sociedade frente a maternidade. Quais são as propostas de acolhimento para estas mulheres? Por que apenas 4 meses e não 3 anos de licença maternidade (como em diversos outros países já existem)? Por que ainda é tabu amamentar a criança em lugares públicos? Por que os hospitais são tão frios e burocráticos em um dos momentos mais sensíveis da vida de uma família? Por que eu estou trazendo estas pequenas questões aqui para este texto? Porque esta Síndrome também existe em virtude de um contexto sócio-político, ou seja, algo muito maior que o nosso umbigo, algo que se expande para seus vizinhos, familiares, conhecidos e desconhecidos. Precisamos trazer para dentro de cada individualidade a sua vivência também como parte de um coletivo, de uma sociedade. Ser mães, nos dias atuais, é viver dentro de um mundo isolado de sua casa. Ser uma mãe contemporânea é ver vídeos sobre as melhores formas de educação e se culpar por não ter conseguido desempenhar o papel que era esperado. Para você, o que é ser mãe? As inadequações também surgem por conta do externo que tensionam mais ainda a mulher. Nós estamos tão segregados e vivenciando nosso individualismo que nos distanciamos das coisas mais importantes para as mulheres que são o compartilhar, agregar, trocar. Para onde nós fomos? Como resgatamos? O individualismo do capitalismo nos colocou em situações onde todos são melhores que você, e com isso, as comparações começam a pipocar. As pessoas se atropelam em seus desabafos com as outras pessoas (quando encontram este espaço) e o acolhimento, mais uma vez, se esvai. Vivemos a pressa, os tropeços. Onde fomos parar?
  2. Comparação com outras mães: dando continuidade ao primeiro exemplo, posso afirmar com muita certeza de que a comparação é uma das maiores dificuldades quando a mulher-mãe está em contato com outras mulheres-mães. A crença de que todas as outras são melhores ou mais competentes que ela é enorme. As comparações nunca cessam, e com isso, para quem tem a Síndrome de Impostora dentro de si, pode ter mais dificuldade em reconhecer suas próprias conquistas e habilidades na hora de criar seus filhos.
  3. Medo de serem descobertas: se antes da maternidade, a mulher, vivenciava sensações em ser vista como fraude, infelizmente, na maternidade, também pode replicar o mesmo comportamento. Nestas situações, as mulheres vivenciam medo de serem descobertas como fraude ou de que outras pessoas percebam que ela não é a mãe que aparenta ser. Eu já ouvi de uma mãe dizer: “é como se eu estivesse fingindo ser mãe”. E convenhamos, a sociedade patriarcal não colabora muito nestas circunstâncias, certo?
  4. Baixa autoestima: se eu não reconheço minhas habilidades internas, possivelmente, a Síndrome de Impostora chega com força. Quando unida à maternidade, o olhar negativo para si passa a ser menos espaçado e com maior impacto maior. visão negativa sobre si mesma passa a ter momentos de ápices maiores e constantes.
  5. Autocrítica excessiva: caso você vivencie esta Síndrome, possivelmente foca muito naquilo que enxerga como errado e falho, e consequentemente deixa de ver todas as outras coisas boas que envolvem a sua maternidade. A rigidez ganha palco e muita força.
  6. Dificuldade em internalizar o sucesso: mesmo com tudo sendo feito de forma amorosa, ainda que receba elogios, esta mulher-mãe não irá internalizar os elogios externos. Dentro de si, acreditam que os resultados têm a ver com sorte ou um truque para enganas os outros.
  7. Sentimento de isolamento: eu atendo mulheres-mães que possuem extrema dificuldade em compartilhar suas experiências com outras mulheres-mães. Vivemos a era da felicidade do Instagram, talvez por isso, também a dificuldade. O isolamento acontece por terem medo de serem julgadas e não compreendidas.

Saliento que a Síndrome de Impostor não é vista como um diagnóstico clínico formal. Entretanto, os relatos não cessam. Por este motivo, recomendo a busca por apoio emocional de pessoas de sua confiança. Aprender a lidar com estes sentimentos é importante para a vida, de forma geral.

As Pressões da Maternidade:

Historicamente, acredita-se que basta o ser humano nascer mulher para querer ser mãe. Isso é algo que, como profissional da área da saúde mental, precisamos repensar. Existem muitas mulheres que eu acredito fielmente que não fosse pela pressão social, buscaria realizar outras formas de maternar (que nem sempre está ligada a parir uma criança).

Tudo isso que aqui escrevo é apenas um recorte de pensamento sobre algo muito maior, que iria necessitar de muitas outras correntes filosóficas, sociais, antropológicas, políticas, psíquicas, entre outros para poder falar um pouco mais sobre. Portanto, não veja isso como uma verdade, mas apenas um fragmento, uma parte de uma realidade de algumas mulheres que não devem ser excluídas do contexto feminino de ser.

Psicóloga Fernanda Rondon

Dando continuidade ao tópico: as pressões sobre a temática da maternidade são muitas das vezes violentas quando o assunto é a expectativa sobre ser mãe. Lanço aqui algumas reflexões:

  1. Perfeição materna: espera-se que toda mulher ao parir uma criança faça um download sabe-se lá de qual lugar sobre como maternar uma criança. Para muitos, as mulheres precisam ser perfeitas no cuidado, na amamentação e na educação, além de equilibrar as tarefas domésticas e as de trabalho, entre tantas outras coisas. Com essa pressão, de serem a perfeição e exemplo, sentimentos de culpa e inadequação pipocam (tanto que queimam).
  2. Dedicação exclusiva aos filhos: mãe perfeita é aquela que irá desprender de si para estar disponível 25 horas do seu dia para cuidar das suas crianças, caso isso não aconteça, é taxada de diversos adjetivos violentos. A mulher precisa estar nos trilhos, caso contrário, voltamos para a Inquisição e somos lançadas às fogueiras das línguas arrebatadoras de profetas que estão em cada esquina.
  3. Estereótipos de gênero: a expectativa de que as mães sejam as provedoras constantes do cuidado e do conforto são enormes. Precisamos ser carinhosas, afetuosas, dar conta das tarefas das crianças, da casa, do trabalho, além de sermos constantemente responsáveis pelas necessidades emocionais das crianças. O dar precisa ser constante: esse copo um dia vai secar. O seu já secou?
  4. Equilíbrio entre trabalho e maternidade: eu leio muito sobre o termo “equilíbrio” quando se fala sobre as tarefas de uma mulher. Eu acho um tipo de palavra muito perigosa quando misturada à maternidade, patriarcado e tantas complexidades. Coloque tudo isso dentro de uma panela para ver o resultado (se é que já não viu). A realidade atual não dá espaço para equilibrar estas tarefas. Precisamos remexer em muitas temáticas e atitudes dos envolvidos para que isso seja visto e vivenciado de formas mais respeitosas. Espera-se o engajamento das mulheres em diversas tarefas, e isso não deveria acontecer. A mulher permanece sendo sugada por todos os ambientes. Equilíbrio é uma utopia para a nossa realidade.
  5. Julgamento e críticas: além das autocríticas que as mulheres têm, existem os julgamentos e críticas negativas de fora. A todo o momento, sem pausa. Basta sair de casa para se confrontar com a violência algumas vezes estampadas e outras revestidas de ursinhos carinhosos. São mães que criticam mães, avós que criticam as mães, até mesmo o vizinho que acha estranho os cabelos das mães estarem todos pro ar enquanto a criança está completamente arrumadinha.
  6. Expectativas de recuperação física rápida: depois do parto, a mulher “precisa”, “tem que”, “deveria”, muitas coisas; uma delas é voltar para à sua forma física, por exemplo. Para outros, precisam estar disponíveis sexualmente para seus maridos (caso contrário…….). A pressão vem de forma sutil, escancarada… e quais são os sintomas na mulher-mãe? Ansiedade e insegurança.

Essas expectativas foram construídas por quem?(dê asas à imaginação mas busque por livros que conversam sobre esse tema). Não há uma fórmula única sobre a maternidade. Nós somos seres que, embora estejamos em sociedade, somos únicos, com olhares diferentes sobre as coisas. Cada mulher tem a sua realidade, e por conta disso, seus próprios desafios. Permita-se! Você é um ser humano, com todas as limitações e imperfeições. Busque apoio, construa uma rede.

Psicóloga Fernanda Rondon

Mudanças de identidade e autoimagem após a maternidade.

Conforme anteriormente dito, a mulher que passa por este fenômeno, tende a se sentir indigna do seu sucesso e sente que será repentinamente descoberta como fraude.

Sabendo também que a maternidade é uma das experiências e transições mais significativas na vida de uma mulher, é natural que exista um “período” de “ajuste” e que algumas características de sua identidade possam sofrer algumas mudanças depois da maternidade. Cuidar de um outro ser humano é um desafio muito quando quando existem mudanças hormonais envolvidas, além de pressões externas vindo de todos os jeitos.

Mulheres que se tornam mães, passando por este fenômeno, tendem a desencadear sensações de não serem boas mães. A comparação surge junto com inseguranças em relação às suas habilidades e passam a questionar a sua real capacidade de garantir que as expectativas impostas pela sociedade e/ou por elas mesmas sejam cumpridas.

Assim como a nossa digital é única, nós também somos seres únicos e desta forma, precisamos saber (mesmo!) que cada um responde de maneiras diferentes às suas próprias maternidades. Ou seja, nem todas as mulheres irão vivenciar mudanças intensas em suas identidades, por exemplo. Algumas, de algum jeito, encontrarão caminhos de administrar e desenvolver sua autoconfiança a medida que o tempo passa, enquanto outras, terão muitas dificuldades.

Caso você se identifica com tudo que mencionei, e sente que esteja enfrentando desafios emocionais depois da maternidade, busque apoio profissional adequado. Procure por um profissional que seja da saúde mental, como um psicólogo ou terapeuta. Apoio de familiares, amigos e grupos sempre serão bem-vindos neste processo mas a terapia é algo que eu recomendo.

Como Superar a Síndrome de Impostora na Maternidade?

Esta é uma resposta de bilhões de dólares, senão, de trilhões. Não sabemos reconhecer nossos sentimentos, temos dificuldade em buscar apoio. Os desafios com os pensamentos autocríticos surgem como uma avalanche diariamente. Como se cultiva uma mente com maior autorrespeito e senso de autocompaixão?

Estas são reflexões que merecem e precisam ser feitas por todas nós. Este fenômeno é um desafio real que afeta a confiança e bem-estar. Busque apoio de algum profissional, para assim, você ter mais possibilidades em se aceitar, e desfrutar da sua própria vida.


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